(ADVERTÊNCIA: texto grande pode encher o saco.)
Publicitário. Sim, Tino é mais um representante dessa profissão decadente. Tino acorda todo dia pensando na reunião de pauta. “Qual a desculpa para a campanha estar tão atrasada?”. Tino pensa mais em se salvar do que salvar a agência. “A culpa é do Diretor de Arte”, repete sempre. Entre os duzentos pares de tênis, tino escolhe sempre o mais colorido para aparecer (e parecer) diferente na reunião.
Tino, criativo, reclama sempre dos prazos, diz que precisa de tempo para florir suas idéias. “O atendimento não consegue mais um dia? Porra, é sempre assim?”. Tino escuta sempre um NÃO do atendimento. Às nove horas (ou dez, ou onze...) Tino retira os brinquedos de cima do teclado e começa a pensar, pensar e pensar (pensar em algo que ganhe prêmio, mesmo que não funcione). “Será que eu já vi isso antes? Acho que não...” se ilude sempre, afinal é referência e não chupada. Mas não pode pensar muito, ele tem hora para ser criativo. Deadline. Sim, como ele costuma dizer.
Tino odeia Briefing mal passado (bife mal passado também) e briga sempre com atendimento. “Porra, mas você não conseguiu um test drive no novo carro?” ou “Porra, ele quer a marca maior?” ou ainda “Porra, eu sei que é absorvente, mas no campo público-alvo você deixa sempre em branco”. Criativo e atendimento são como gato e rato, não, melhor, como uma final entre Brasil e Argentina. O criativo, Brasil, sempre moleque, diferente, relaxado, cheio de jinga e malícias. O atendimento, Argentina. Bravo, forte, duro, objetivo e sem frescura.
Tino não tem vida social e come muita pizza na agência (fora dela também) tarde da noite. Fica até tarde criando (idéias e cabelos brancos, mas nenhum animal). Tino, conhece seus amigos pelo msn, onde, 70% ele nunca viu pessoalmente. Tino, o homem-ego. Fica sensível quando o Diretor de Criação põe o dedo na sua idéia. “Vai tirar o macaco? Mas é uma paródia de King Kong!”. Tino acha que o Diretor de Arte é seu escudeiro, nunca vê como dupla (por outro lado, o Diretor de Arte o vê como um saco, asqueroso, megalomaníaco etc.). Tino acha natural trabalhar 12 horas por dia sem hora extra, isso não existe em publicidade. Seria como um jogador cobrar pelos dribles extras que faz em campo.
Tino adora fazer analogia com futebol (todo publicitário brasileiro gosta, mas não entende nada). Tino usa óculos de aro grosso, cabelo modernoso, calça jeans, tênis e camiseta (mesmo com 45 anos). Tino adora uma gracinha, seu forte é o humor nas peças (o atendimento odeia isso, quer sentimentos pois sabe que o cliente aprova com mais facilidade). “O cliente pediu para colocar a filha dele?...” Tino nunca está conformado.
Tino vive rodeado de amigos de todos os sexos (todos mesmo), coisa do meio. E a pesar de sempre confundido com gay (principalmente pela família) Tino é apenas um hetero problemático que tem, ops, tinha namorada. Há três dias recebeu um e-mail dela acabando. “Não sei por que”, se ilude. Tino vai ao bar com os amigos para falar de publicidade (ele usa duas cadeiras, uma para ele e outra para o ego), mesmo quando diz (mente) que não gosta de falar de trabalho. Sua (ex) namorada odiava isso.
Tino adora as premiações. Quando ganha o discurso é o mesmo: “trabalhamos para o cliente, o sucesso veio de uma equipe criativa”. Odeia quando um “amigo” ganha prêmio. Tem sempre o sorriso amarelo para dizer “Parabéns”. Publicitário não tem amigo publicitário, um tá sempre falando mal do trabalho do outro, mesmo que não admitam isso publicamente, o fato é incontestável. Tino não assiste programa de TV, assiste o intervalo comercial. O mesmo vale para revista, rádio, outdoor etc. Tino ganha pouco, tá, não é tão pouco, mas é pouco. Em compensação, ganha muito trabalho. Tino se diz diferente do estereotipo de publicitário e tenta ser o mais diferente deles. Por isso mesmo é um publicitário. Pobre Tino.